Aqui em Argel, é todo um novo universo cultural. A dúzia de palavras em árabe que conheço não me permitem transmitir-vos (nem tão pouco entender) os "cumprimentos" que recebo diariamente no percurso de e para casa, nas paragens de autocarro ou no trajecto a pé.
Recentemente, no stand da empresa na Feira Internacional de Argel descobri o "subtil" charme masculino local - esse tesouro escondido do Norte de África. É um povo mediterrânico a 100%, a quem não falta, Al-Hamdulillah (graças a Deus), o azeite e a azeitona, a linguagem gestual, os citrinos e as nêsperas, o bigodinho, a mestria do mar e das suas técnicas. E foi aqui que enriqueci mais uma vez o meu vocabulário francês.
draguer
verbo transitivo
1. dragar;
2. (pesca de moluscos) pescar com rede em forma de bolsa;
verbo intransitivo
(coloquial) seduzir, engatar;
Eis-me vestida de preto, simples, como se trabalhasse nos bastidores de um teatro (uma tentativa de invisibilidade, digamos, para deixar sobressair os painéis da empresa, magníficos, aliás) e eis-me também embrulhada no diálogo que descrevo de seguida
- És tão gira (dizem dois homens nos seus cinquentas, a entrar no stand)
- Boa tarde. Os senhores entraram aqui só para dizer isso? É que eu estou aqui para apresentar uma empresa...
- Ah, não, mas sabes, é que nós somos arquitectos e tu és tão gira e...
- ...vou falar-vos na empresa ou atender as pessoas que estão à espera?
- Oh não, de todo, dizem eles ao mesmo tempo que se sentam nas cadeiras ao meu lado, queremos saber tudo sobre a empresa, ainda por cima uma empresa que tem obras tão bonitas como estas, e uma pessoa tão bonita para nos falar nelas, sabes, Deus criou o Mundo e a Beleza, nós como arquitectos gostamos de tudo o que é belo e...
- (...e entretanto puz a cassette do início e comecei a lenga-lenga de a empresa faz isto e aquilo, tem x anos, trabalha em todos os sectores de tal e tal, tem obras aqui na Argélia desde bla bla e nos sítios a, b, e c. Aqui estão as coordenadas da empresa e do Director-Geral, "veuillez nous envoyer un fax avec vos reinseignements" ao que eles respondem
- Oh - mas não está o teu número de telefone aqui no cartãozinho, pois não? Era muito melhor se pudéssemos contactar-te directamente...
É capaz de não ser nem política nem profissionalmente correcto descrever aqui a forma como lhes expliquei que só dou o telefone da empresa. Mas admito que fiquei espantada com a versatilidade destes meus semi-colegas de métier - eles imaginam, eles desenham, eles constroem, e até se dedicam à pesca.
